ChatGPT: de marolinha ao tsunami

Bem-vindos à nova revolução

ChatGPT: de marolinha ao tsunami ChatGPT: de marolinha ao tsunami

Por José Augusto Albino*

A cada cerca de 10 anos, o mundo se depara com uma nova tecnologia que chega para mudar tudo, desbancando as tecnologias anteriores e criando novos mercados e novos paradigmas na economia e na sociedade! Foi assim com a chegada dos PCs e o lançamento do Apple II em 1977, da internet nos anos 90 aos lares e, finalmente em 2007, o lançamento do Iphone. Tecnologias e companhias que pareciam monopolistas e potências inabaláveis viram seus domínios desaparecerem em questão de poucos anos, e algumas conseguiram se reinventar (como a IBM) e outras praticamente morreram (alguém ainda lembra do Blackberry?).

Passados mais de 15 anos desde a nossa última grande revolução, no final de 2022 o mundo viu o que parecia ser uma marolinha e está claramente virando um grande tsunami: foi lançado pela OpenAI o ChatGPT. De cara, a tecnologia já desbancou todas as anteriores em velocidade de adoção, atingindo mais de um milhão de usuários em poucos dias e, atualmente, se estima que já tenha mais de 100 milhões de usuários. Este número não para de crescer e cada dia que passa novas aplicações são descobertas e o céu parece o limite para este simpático robô.

O que parecia um simples chatbot, ou um Wikipédia, interativo está se mostrando uma forte ferramenta de otimização de tarefas intelectuais. Algumas pessoas comparando a chegada do ChatGPT à revolução trazida pelo arado mecânico na agricultura, só que desta vez a produtividade é justamente a nossa capacidade de gerar trabalho ou tarefas intelectuais. Mesmo sem integração/API devidamente rodando, já se começam a vislumbrar aplicações infinitas.

Quer pedir uma pizza? Para que ir no Yelp e depois no ifood, se você pode simplesmente escrever no ChatGPT: “quero a melhor pizza napolitana da cidade, que chegue em 30 minutos e custe menos de R$ 50,00”. Automaticamente o robô baseado na Azure vai buscar todas as pizzarias da cidade, vai entrar nas plataformas de delivery e ver qual entrega mais rápido, vai entrar no Yelp, Guia Michelin, revistas, blogs e jornais para descobrir quais são as melhores avaliadas e em menos de 30 minutos esta pizza estará na sua porta.

Já sabendo programar em diversas linguagens, a plataforma começa a escrever linhas de códigos com base em pedidos simples de seus usuários, realizando em questão de segundos o que um experiente desenvolvedor levaria horas ou talvez dias. Está com preguiça de ler um livro? Sem problema, ele escreve um resumo de qualquer obra que você pedir, e se achar o resumo longo, pode pedir para ele fazer em exatamente 200 palavras que ele vai entregar. Ou se quiser, ele também faz o contrário, conte a ele um resumo de uma história e ele fará um poema, um artigo ou até um livro todo. As aplicações são infinitas e graças ao volume estratosférico de dados disponível na internet, ele vai evoluindo e aprendendo cada vez mais.

A cada nova aplicação, surge uma nova oportunidade de negócio, e é aqui que a coisa começa a ficar feia! O Google possui uma liderança importante no mercado de buscas, tendo uma posição praticamente monopolística em alguns espectros, mas finalmente começa a enfrentar um verdadeiro concorrente. Afinal, porque diabos eu preciso entrar em dez sites para buscar resumos de livros, ou descobrir qual a melhor pizza, se simplesmente eu posso pedir para o ChatGPT e ele me dá o resultado?

O modelo de negócios de vender cliques claramente pode estar mudando para o negócio de vender informações mastigadas, e isso é uma péssima notícia para o Google – que agora enfrenta um momento de se reinventar como a IBM, ou correndo o risco de virar o Blackberry. Para piorar, o grande financiador e parceiro da OpenAI (criadora do ChatGPT) é nada mais nada menos que a poderosa Microsoft. A companhia de Bill Gates investiu mais de US$ 10 bilhões na tecnologia, emprestando sua Cloud para isso e já começando a lançar as primeiras integrações com seus produtos, notadamente o Bing, sua ferramenta de busca.

O primeiro round dessa disputa foi uma surra para ChatGPT. Com o sucesso do ChatGPT, o Google se apressou para lançar o seu concorrente (Bard), que se mostrou um grande fiasco ao errar respostas simples e objetivas. Os próximos rounds começaram agora. 

Disputa acirrada

A luta deverá ser longa e dura. De um lado do ringue, a Microsoft promete integrar a seus produtos, especialmente as ferramentas de trabalho (Teams) e o pacote Office. Além disso, novos concorrentes estão prontos para entrar no combate, boatos dão conta de que Apple e Meta/Facebook já trabalham nas suas versões. Para deixar a briga ainda mais interessante, bilhões de dólares já estão sendo investidos em startups que prometem novidades no mercado, com destaque para a Anthropic que levantou US$ 300 milhões do próprio Google.

Ainda é cedo para dizer se haverá um vencedor nesta disputa, ou se todos serão vencedores, em detrimento de outras indústrias e profissões. Apesar de ter tomado um gancho de esquerda e um cruzado de direita logo no primeiro round, o Google tem todas as armas e ferramentas para se defender: já é líder do mercado, possui uma quantidade de dados (matéria prima básica de qualquer AI), é dona do seu navegador e possui um ecossistema muito mais amplo para aplicações no dia-dia. Facebook por outro lado, possui todos nossos dados e informações sociais. Apple está conosco quase 24 horas por dia e possui dados detalhados sobre a saúde e estilo de vida dos usuários do Watch. Já a Amazon sabe seus hábitos de compra e conhece bem todos os produtos do mundo.

A luta será feroz, mas acredito que todas as big techs tem capacidade de desenvolver business gigantes e de infinitas possibilidades, cada um no seu nicho, cada um na sua aplicação e cada um no seu estilo. A única certeza que tenho é que no final, além de nós usuários, as big techs serão as vencedoras, e mesmo que ações do Google tenham sofrido nas últimas semanas com o risco de concorrência, o ChatGPT ainda está muito distante de retirar receita do Google que segue com a sua máquina de imprimir dinheiro saudável e tem um universo de possibilidades pela frente.

Os próximos rounds serão emocionantes, e com certeza tem que ser acompanhado de perto por todos! Boa sorte e bem-vindos à nova revolução!

* Albino é fundador da Catarina Capital.